Canto XXVIII

Dante volta os olhos para Beatriz, que estava atrás dele; depois, mira para a frente e vê um ponto brilhantíssimo, em torno do qual se movem nove círculos de luz, que giram mais rapidamente e são mais brilhantes quanto mais próximos estão dele. Aquele ponto é Deus; os círculos são os coros angélicos.


A jornada até este ponto havia sido repleta de revelações e desafios. Cada novo insight parecia me levar mais perto de uma compreensão plena, mas, ao mesmo tempo, também me deixava com mais perguntas. Agora, enquanto eu estava diante daquele brilho avassalador, senti algo diferente, como se o próprio universo estivesse ao alcance do meu entendimento, mas ainda um pouco além de minhas capacidades humanas. A verdade que eu procurava se revelava de forma sutil, como uma chama que brilha no reflexo de um espelho antes que a percebamos diretamente. Sabia que era real, como alguém que olha para trás e vê o reflexo de uma vela iluminando seu próprio rosto, sentindo a confirmação de que o que vê está de acordo com sua percepção.

Meus pensamentos estavam em desordem, mas então, lembrei-me daquelas vezes em que os olhos dela me guiaram, aqueles olhos que agora pareciam prender minha alma. Quando me virei, sentindo a intensidade daquele olhar, fui consumido por uma nova visão. Um único ponto brilhava com tamanha intensidade, que eu precisei fechar os olhos. O brilho era insuportavelmente agudo, como uma luz que queimava não apenas a visão, mas parecia alcançar minha alma.

Eu não conseguia imaginar nada que se aproximasse daquele poder. Se uma estrela fosse colocada ao lado dessa luz, ela pareceria nada mais do que uma lua fraca ao lado de um sol nascente. Em volta desse ponto de luz, círculos de fogo giravam em uma velocidade inimaginável, como se fossem impulsionados por algo muito além das forças conhecidas por nós. Estes círculos eram sucessivamente envoltos por outros, cada um mais distante e mais lento do que o anterior, até que o sétimo círculo era tão vasto que até mesmo o mensageiro de Juno, Mercúrio, não seria capaz de contê-lo em suas asas.

Os círculos continuavam a se expandir, cada um movendo-se em uma dança de luz e fogo, com a velocidade diminuindo à medida que se afastavam daquele ponto central. Quanto mais longe estavam do ponto de origem, mais lentos e menos brilhantes se tornavam. E, no entanto, minha atenção estava presa ao círculo mais próximo, o que brilhava com maior pureza, e percebi que essa proximidade indicava uma maior verdade, uma maior conexão com aquela luz infinita.

Sentindo minha inquietação, ela falou com a suavidade e a clareza que sempre trazia paz à minha mente. “Daquele ponto”, disse ela, “depende o céu e toda a natureza. Olhe o círculo mais próximo e saiba que ele se move com tamanha rapidez devido ao ardente amor que o impulsiona.”

Eu, ainda em busca de respostas mais profundas, respondi: “Se o mundo estivesse organizado como vejo nessas rodas, eu estaria satisfeito. Mas no mundo que conhecemos, as esferas mais distantes do centro parecem as mais divinas. Se o meu desejo é compreender este templo angelical que se ergue com amor e luz como seus limites, então preciso entender por que o exemplo terreno e o celestial não seguem o mesmo padrão.”

Ela sorriu suavemente, como quem já esperava essa pergunta. “Se teus dedos não conseguem desvendar este nó, não te surpreendas; ele é apertado para quem não tenta desenrolá-lo. Ouça, se queres saciar tua curiosidade.” E assim ela continuou, guiando-me pelas nuances daquele mistério cósmico. Explicou que os círculos materiais, aqueles que podíamos observar no céu, eram amplos ou estreitos de acordo com a virtude que os preenchia. Quanto maior a virtude, maior o corpo celeste que ela habita. E o círculo que absorve todo o universo dentro de si é aquele que ama mais e conhece mais, movendo-se com uma intensidade correspondente à sua proximidade com a fonte de todo amor e sabedoria.

A clareza das suas palavras foi como o sopro de um vento purificador, como o Bóreas dispersando as nuvens, deixando o céu limpo e brilhante. A turbulência em minha mente dissipou-se, e a verdade apareceu diante de mim com uma serenidade quase divina. Cada círculo de luz ao meu redor começou a brilhar com uma intensidade renovada, como faíscas saltando de uma fogueira ardente. E eram tantas faíscas, que perder a conta era inevitável, mais do que o número dobrado de casas em um tabuleiro de xadrez.

De coro em coro, eu ouvi cânticos de “Hosana”, em reverência ao ponto fixo que mantinha tudo no seu lugar, aquele ponto que sempre foi e sempre será o centro de tudo. Aquela que sempre entendia meus pensamentos, mesmo antes de eu os formular, falou novamente. “Os primeiros círculos que viste representam os Serafins e os Querubins, os mais próximos ao ponto de origem. Eles movem-se com tamanha rapidez porque desejam se assemelhar à luz divina o máximo que podem. E eles podem se aproximar tanto quanto sua sublime visão permite.”

Ela continuou, revelando o nome e a posição de cada ordem celestial, desde os Tronos até os Arcanjos e Anjos, descrevendo como cada um se movia em perfeita harmonia com o amor e o conhecimento divino. A beleza da ordem celestial era irresistível, e enquanto eu tentava absorver cada detalhe, ela mencionou Dionísio, que havia contemplado esses mesmos mistérios com tanta devoção que foi capaz de nomear e organizar essas hierarquias. No entanto, mesmo ele, ao lado de Gregório, compreendeu que esse conhecimento era tão vasto que, ao chegar ao céu, Gregório riu de si mesmo ao perceber o quanto havia deixado de ver enquanto estava na Terra.

A revelação era esmagadora, mas ao mesmo tempo, estranhamente reconfortante. Eu sabia que não poderia compreender tudo, mas o que eu via agora, ali, naquele momento, me preenchia de uma sensação de paz que eu nunca havia experimentado antes. Como se, finalmente, eu tivesse vislumbrado o coração de tudo, e ele era feito de pura luz e amor.